Noites quentes para você

Uma das coisas mais bizarras da nossa viagem até agora começou alguns dias antes de embarcarmos. Fechamos nossa hospedagem para os dias que antecediam o Coachella e, por medidas de segurança, só quando já está tudo confirmado você recebe o email pessoal de quem vai te hospedar.

Encontramos o quarto perfeito num condomínio lindo em uma cidade bem perto de Coachella e fizemos nossa reserva. Recebemos a confirmação da hospedagem, todas as informações e o contato de nossa host, que era muito…sugestivo. Basicamente, o email era um “As noites mais quentes para você”. Oi?
Demos nossa stalkeada básica e não encontramos nada demais. O perfil no site só tinha 2 reviews, ambos muito simpáticos. A foto era de uma senhora de uns 50 anos junto com uma cachorrinha, não fazia o menor sentido. Depois de ficar muito com o pé atrás, procurar algum outro lugar e não encontrar nada, resolvemos arriscar.

Chegamos em sua casa super tarde, depois do combinado, e mesmo assim ela foi um amor com nós dois. E assim foi  o resto do tempo que estávamos por perto. É claro que me deu um pouco de medo na noite que chegamos, quando ela foi mostrar a casa e os quartos, tudo com decoração super burlesca e à meia luz, mas no fim deu tudo certo.

Ao longo dos dias ela nos deu milhares de dicas e mapas, conversamos bastante e finamente entendemos o porque daquele contato: ela trabalha com Sex Calls há mais de 30 anos. TRINTA anos. E não tem o menor problema com aquele email.

Aí fomos conversando e descobrindo várias coisas sobre aquele mundo. Dentre elas, tomamos um susto em saber que ela tem clientes fixos há todo esse tempo. Há mais de 30 anos eles conversam com uma mulher e não fazem a menor ideia de como ela é, onde ela mora, seu nome real e sua vida longe do telefone. São casados, solteiros, divorciados e, como todo mundo deve imaginar, seu trabalho acaba virando muito mais de psicóloga do que qualquer outra coisa.

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Ela também contou que tem MUITOS homens que ligam para ela para conversar e, ao longo do tempo, acabam assumindo que não gostam tanto assim de mulher. Muitos, inclusive, são casados, e mantiveram esse padrão por causa de pressão da família e tudo que já estamos cansados de saber. Eles contam que não se sentem bem em um corpo de homem, que gostariam muito de se relacionar com outros homens ou que queriam só se libertar desse mundo. E usam um número de sexo por telefone para tentar entender isso.

Também tem os que ligam todas as noites, os que ficam com ciumes de outros clientes, os que discutem com ela e depois ligam mais de 30 vezes para pedir desculpa se sentindo super culpados…várias histórias. É engraçado que, no fim, o objetivo inicial que era o sexo por telefone acaba ficando em segundo plano, já que ela se torna muito mais amiga/psicóloga de cada um deles. Mas é claro que eles continuam pagando por hora.

Ah! E esquecendo um pouco seu trabalho, ela teria tudo para ser a sua avó: uma casa super decorada, comprou muffins para nosso café da manhã, a cachorrinha que fica na porta do quarto esperando você acordar , os livros de culinária e até a preocupação com os perigos no trânsito. Tirando isso, ela namora há um bom tempo uma outra mulher, já viajou bastante de carro pelos Estados Unidos e por outros países, já teve uma empresa gigante de garotas que faziam sex calls…muita coisa interessante e, ainda bem, muito diferente do que imaginávamos!

O melhor de tudo é que acabamos nos dando super bem e conversando por horas com ela, que foi uma fofa! Já faz mais de um mês que saímos de lá e ainda trocamos emails, contamos da viagem, ela fala da sua cachorrinha e como são seus novos hóspedes. Essa é a parte mais legal de ficar em um quarto privado: conhecer quem mora ali, ouvir um pouco sobre a sua vida, os lugares que ela gosta de frequentar, fazer amizades diferentes e realmente imergir naquele mundo.

A experiência tinha alguns motivos para ser uma roubada e ficamos bem assustados com essa possibilidade ( ainda mais no primeiro destino de nossa viagem), mas tudo deu muito mais que certo e agora temos uma amiga do interior da Califórnia, que tem mais de 50 anos e faz sex calls! Muito exótico, não? Hahhaha

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2 Comments

  • Apaixonada por essa história! Talvez por ter acompanhado o receio de vocês lá na agência antes de irem (e rido muito do email, porque así soy yo, né? haha).

    É demais isso, né? As histórias que a gente vive pra contar numa viagem. Experiências que, sentados na mesa do trabalho mais de oito horas por dia e limitados ao nosso círculo social aos finais de semana, a gente nunca teria.

    Sinto até uma leve tristeza de nunca ter registrado decentemente as minhas aventuras com a Tainá no começo do ano. Mas os rascunhos tão lá e uma hora tudo vai acontecer.

    Enquanto isso, fica aqui registrado o que mais tem me despertado essa aventura de vocês: meu desejo de viajar, que costumava ser tão contido, agora anda incontrolável. Tô curtindo muito, como se estivesse aí juntinho.

    Aproveitem e eu quero ver os milhões de fotos quando voltarem. <3

  • Adorei a matéria! Super jornalística, me lembrei de quando estava na faculdade, fui para a Nicarágua, ficamos hospedados em uma casa de moradores e também tivemos uma experiência semelhante, de entrar no dia a dia das pessoas, e de todos os estrangeiros que também iam trabalhar voluntariamente por lá. Parabéns pelo texto, Debbie!

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